Gostaria de
explicar qual é a importância do amor e da compaixão. É importante
saber o que é compaixão, algumas vezes pensamos que é pena, mas isso não
é compaixão. Compaixão é o senso de preocupação, mas mais do que
isso, é a noção clara de que todos os seres têm exatamente o mesmo
direito à felicidade. Essa compreensão é que nos traz a compaixão.
Também um
outro aspecto que costuma ser confundido com compaixão é a sensação de
proximidade, de ligação que temos com amigos e parentes. Mas isso não
é compaixão verdadeira, porque esse sentimento está ligado ao apego.
Muitas vezes,
nosso senso de preocupação com o outro depende da atitude que ele
adota. Se a pessoa age de forma negativa, nosso senso de compaixão
desaparece. Mas um senso de compaixão verdadeiro é o que nos leva a
ver o outro como tendo exatamente o mesmo direito que eu à felicidade.
A compaixão que se assenta no apego não se sustenta. A que se baseia
na compreensão da igualdade de todos os seres é desprovida de apego, e
é verdadeira.
Qual é o
benefício da compaixão? Ela nos traz força interior. Geralmente, temos
um senso de "eu, eu, eu". E nossa mente centra tudo em nós mesmos.
Então, todas as experiências negativas, mesmo pequenas, se tornam
muito dolorosas, enormes. Mas quando pensamos nos outros, nossa mente se
amplia, e os nossos pequenos problemas se tornam realmente pequenos, e
as coisas negativas não prejudicam nossa mente.
Alguns, quando
experimentam tragédias que são involuntárias, se sentem enterrados em
uma montanha de sofrimento. Mas, por outro lado, quando se pensa
voluntariamente nos problemas dos outros, se procura alivia-los de
seus sofrimentos, essa atitude voluntária traz uma abertura para o
ser. Dessa maneira, mesmo em meio a problemas pessoais, isso traz uma
base de clareza, e a pessoa será capaz de se sustentar.
COMPAIXÃO E BEM-ESTAR
— Quando se pensa em compaixão por outras pessoas, alguns perguntam
se isso não seria sinônimo de auto-sacrifício. Não, não é. Porque não
se deve ser negligente em relação a si mesmo. E, baseado na minha
própria experiência, acredito que se deve ser compassivo em benefício
próprio.
Um exemplo:
uma vida feliz precisa de amigos, apoio. Há amigos do dinheiro, amigos
do poder, mas para esses indivíduos, se o dinheiro acaba ou o poder
se vai, a amizade também acaba. Mas os amigos verdadeiros ficam.
Então, como
criar amigos verdadeiros? Se você tiver um sentimento de compaixão,
terá mais amigos verdadeiros. Mostre sentimentos gentis e sorria, e
terá bons amigos. Porque essa atmosfera pacífica será a sua base, que
irá criar as condições para a amizade.
A prática de
compaixão também é imensamente benéfica para a saúde. De acordo com a
medicina, os que tem mais compaixão, são mais interessados pelos
outros, geralmente são mais saudáveis quando comparados com pessoas
egoístas. Os egoístas sofrem mais freqüentemente de enfartes e outras
doenças.
A mente mais
egoísta, mais voltada para si mesma é muito ruim para a saúde. A
mente mais compassiva, mais voltada para o próximo traz mais
tranqüilidade, resultando por isso em saúde muito melhor.
Vejamos a
sociedade atual, em que a criminalidade está crescendo, ligada à
problemas econômicos e sociais, como a diferença entre ricos e pobres
(inclusive entre países ricos e pobres). No nosso sistema educacional,
muita atenção é dada ao desenvolvimento do intelecto, e menor atenção
é dada ao coração, aos sentimentos. Pois isso é considerado tarefa da
religião. E assim as crianças não recebem nenhuma orientação sobre
como serem mais compassivas, e desenvolver um coração mais generoso.
Mas a compaixão é tão importante para a sociedade que é incentivada
por todas as religiões.
AS RELIGIÕES E A COMPAIXÃO
— Por causa das diferenças filosóficas entre as grandes religiões
existem diferentes técnicas para desenvolver a compaixão e algumas
diferenças da definição do que seja. Mas basicamente todas elas falam
da necessidade de se cultivar a compaixão.
Portanto,
sinto que mesmo neste século, as maiores tradições religiosas têm um
papel importante no desenvolvimento dessas qualidades. Vejo aqui
pessoas de diferentes tradições religiosas, o que me faz sentir feliz,
porque a tolerância religiosa é muito importante. E acredito que,
independente de diferentes tradições religiosas, todos temos o potencial
de ajudar a umanidade.
Vim do Oriente e
sou um monge budista, assim, naturalmente, quando falo desses valores
e do treinamento da mente, o faço da minha perspectiva de monge
budista. Mas é claro que não quero influenciá-los. Vocês devem manter
suas tradições religiosas, mudar de religião não é bom, pode gerar
mais confusão do que benefício. Portanto, mantenham e sigam sua fé.
Cada uma das
grandes religiões tem coisas únicas, mas também há muita coisa em
comum entre elas. Assim, é sábio usar técnicas úteis de outras
religiões, mesmo sem mudar de religião. Até para aplicá-las na própria
religião. Com isso, as tradições religiosas diferentes desenvolvem
respeito mútuo e compreensão. Isso é fundamental.
A compaixão e a
bondade são indispensáveis. Sem esses valores não há felicidade. Mas
muitos crêem que a prática de valores como a compaixão, o perdão e o
amor são relevantes apenas para os que praticam uma religião. Isso não
é verdadeiro. Podemos ver que no passado e presente existiram pessoas
que mesmo sem nenhuma fé religiosa tinham esse sentimento de
cometimento, de responsabilidade, de compaixão pelo próximo. Essas
pessoas se tornaram mais felizes, mais úteis, mais benéficas para a
sociedade.
A UNIVERSALIDADE DA COMPAIXÃO
— Podemos questionar se o valor da compaixão, de um coração
compassivo é universal. Eu acredito que todos os seres humanos têm o
mesmo potencial. Basicamente, o ser humano é voltado para a vida e
comunidade. Assim, a semente da compaixão está lá, a semente do
trabalho em conjunto está lá. É da natureza humana trabalhar em
conjunto. O individualista não pode sobreviver.
As abelhas
também são animais sociais. Não há polícia, não há um estado, no
entanto trabalham em conjunto. Uma abelha não pode ser individualista.
Mas, diferentemente dos outros animais sociais, o ser humano tem a
capacidade de se votar ao altruísmo ilimitado. Temos a semente da
compaixão dentro de nós. Todos nós.
Quando vemos
os benefícios de uma mente compassiva, e o mal de uma mente não
compassiva, é fácil ver a diferença. Então, voluntariamente iremos
analisar cada vez mais, mudar cada vez mais a nossa atitude. E assim,
dia após dia, mudamos.
O treinamento
da mente não pode ser imposto a ninguém. É preciso que nós mesmos
vejamos os benefícios. Pense sobre o que o ódio traz para sua vida,
para sua saúde, para as pessoas que estão à sua volta. Pense sobre a
compaixão e o que traz. E assim, teremos o ímpeto de cultivar certos
valores, e rejeitar outros.
Dessa maneira
crescemos a cada dia, mas se não fazemos nada para reduzir nosso ódio e
cultivar a compaixão tudo ficará como está, a semente nunca irá
germinar.
Normalmente
nossos problemas nascem de percebermos apenas o nível das aparências, e
não a realidade. Ficamos no nível das aparências, e com base nelas
fazemos o nosso julgamento. Também nos concentramos na felicidade de
curto prazo, e não na de longo prazo.
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